Conforme apresenta o desembargador Alexandre Victor de Carvalho, a reforma processual penal promovida pela Lei nº 11.690/2008 inaugurou uma nova fase no sistema probatório do processo penal brasileiro. Ao alterar o art. 155 do Código de Processo Penal, o legislador reafirmou a importância da prova judicializada, produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.
Em consonância com essa orientação constitucional, o desembargador, no processo de apelação criminal nº 1.0338.03.015299-9/001, apresentou voto vencido propondo a absolvição do réu por considerar que a condenação estava fundamentada apenas em elementos colhidos na fase do inquérito policial. Descubra mais sobre o assunto a seguir:
A centralidade do contraditório na prova do inquérito e nulidade da condenação
O voto do desembargador Alexandre Victor de Carvalho foi enfático ao destacar que, após a vigência da Lei nº 11.690/08, não é mais possível basear uma condenação exclusivamente em provas colhidas na fase inquisitorial. Segundo ele, a nova redação do art. 155 do CPP exige que a convicção do juiz seja formada a partir das provas produzidas em contraditório judicial. Elementos informativos do inquérito, como declarações à polícia, não podem mais servir de fundamento exclusivo para uma decisão condenatória.

Ao analisar os autos, o desembargador observou que a condenação se baseava, fundamentalmente, nas declarações prestadas pela vítima à polícia, que sequer foi ouvida em juízo, e no testemunho indireto de sua esposa. Para o magistrado, a ausência da oitiva direta da vítima ou de testemunhas presenciais no curso do processo judicial torna a condenação insustentável. Assim, propôs a absolvição do réu por ausência de prova válida e suficiente para a formação do juízo de culpa.
Testemunho indireto e o risco à presunção de inocência
Outro ponto de destaque no voto do desembargador foi a crítica ao uso do chamado testemunho indireto. A única testemunha ouvida em juízo, esposa da vítima, apenas reproduziu o que o ofendido lhe teria dito sobre o suposto autor da agressão. Para o desembargador, esse tipo de prova é inidôneo, pois representa um relato de segunda mão, sem a possibilidade de verificação direta pelo juízo ou pelas partes.
Reforçando sua posição, Alexandre Victor de Carvalho argumentou que o depoimento é um ato personalíssimo, não sendo possível transferir a credibilidade de uma declaração feita por terceiro ausente do processo para uma testemunha que apenas a reproduz. Para ele, permitir esse tipo de construção probatória seria validar uma forma de condenação sem contraditório, em clara violação aos direitos fundamentais do acusado.
Divergência no julgamento e consolidação da jurisprudência
Apesar do voto técnico e garantista do desembargador Alexandre Victor de Carvalho, a maioria da 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais entendeu que havia elementos suficientes para manter a condenação. O desembargador, relator para o acórdão, argumentou que o exame de corpo de delito, os laudos médicos e o depoimento da esposa da vítima eram suficientes para sustentar a autoria e a materialidade do crime.
Na visão do relator vencedor, ainda que a vítima não tenha sido ouvida em juízo, o conjunto probatório, que incluía laudos periciais indicando debilidade permanente no dedo da vítima e risco de vida, era robusto. Ele destacou também que o acusado apresentava uma versão defensiva isolada e sem respaldo probatório, o que justificaria a manutenção da sentença condenatória. O voto foi acompanhado por outro desembargador, consolidando o entendimento majoritário.
Conclui-se assim que, o voto vencido do desembargador Alexandre Victor de Carvalho no processo de apelação criminal nº 1.0338.03.015299-9/001 reafirma seu compromisso com os princípios constitucionais que regem o processo penal democrático. Ao reconhecer a insuficiência de provas judicializadas e rechaçar o uso de elementos colhidos exclusivamente na fase inquisitorial, o magistrado defendeu a centralidade do contraditório e o respeito à presunção de inocência como pilares inegociáveis da justiça penal.
Autor: Artem Vasiliev